A regulamentação da prostituição é um tema que a sociedade insiste em afastar do debate público e que constantemente coloca mulheres e homens à margem da sociedade, vendo ser-lhes negado qualquer tipo de direito, qualquer tipo de apoio social, qualquer tipo de cuidado de saúde.
Ao falar-se de prostituição surge inevitavelmente, na cara de grande parte das pessoas, um sentimento de repulsa e de uma certa imoralidade associada ao exercício da mesma, considerando claro que a sua prática traduz uma atitude que mancha o prestígio e a honra. Este tipo de reações continua a espelhar o quanto a nossa sociedade precisa de amadurecer, de aprender a viver sem tabus, sem preconceito e, acima de tudo, com solidariedade e muito civismo.
A ideia de que prostituição não passa do ato de fazer sexo com outra pessoa, em que a partir disso resulte uma compensação remuneratória, é visto por muitos como algo repugnante, algo que deve ser perseguido e severamente punido. Se é verdade que a prostituição é algo que surge em alguns dos casos fruto de carências económicas, é por outros uma escolha e uma liberdade de fazer com o seu corpo aquilo que bem entende.
É sabido por muitos que a prostituição é uma “atividade” que nunca irá acabar, independentemente das restrições legislativas ou consequências penais que daí advenham, e tudo isto por uma razão muito simples, as pessoas necessitam, querem e são livres de fazer com o seu corpo aquilo que bem entendem. Hoje, mais do que nunca, antes de condenar qualquer profissional do sexo, devemos sim questioná-los acerca daquilo que precisam, do apoio que a sociedade lhes pode dar.
O tema da prostituição acaba, assim, por andar numa espécie de montanha russa, em que hoje, fruto de uma situação específica, como é o caso da crise económica causada pela Covid-19, acaba por ser foco das atenções mediáticas da sociedade e noutros momentos é completamente esquecida, deixando novamente os/as prostitutos/as abandonados, excluídos e maltratados. Segundo algumas das associações que prestam apoio a estas pessoas, todos os anos, centenas de homens e mulheres são violados, agredidos e chantageados pelos supostos “clientes”.
Dirão muitos que a solução a esta situação estará na apresentação de queixa às autoridades competentes, o que até estaria certo se estas vítimas não tivessem receio que as próprias autoridades, como já tivemos notícias disso, se aproveitassem sexualmente das mesmas ou acabassem mesmo por puni-las pela prática da sua atividade. Resumindo, estas pessoas acabam por, na maioria das situações, estar entregues à sua própria sorte. Em suma, se muitas mulheres e homens veem esta prática como sendo a sua atividade profissional, porque não incluí-los no modelo atual que regula os deveres e os direitos sobre o seu trabalho? Porque não protegê-los de quem os maltrata? Porque não dar-lhes um acompanhamento médico regular para que possam laborar em segurança? É completamente inadmissível que a sociedade portuguesa continue a fingir que este problema não existe e que em pleno século XXI continue apática e com o seu sentido crítico completamente em estado vegetativo.
Os valores conservadores e bafientos que se prolongam no tempo tornam Portugal, a este nível, num país cobarde e incapaz de evoluir socialmente. Fiquei verdadeiramente esperançoso quando, no passado mês de julho, foram ouvidas na Assembleia da República, pelos deputados, as peticionárias para a regulamentação da prostituição. Espero é que a coragem dos nossos representantes prevaleça de uma vez por todas e que haja consciência que ao ser eleito para um mandato legislativo se representam todos os portugueses!

Afonso Domingos
Presidente da JS de Mértola